sexta-feira, 28 de novembro de 2014

Os vícios aceitáveis - 2

No post anterior, eu falei sobre vícios e ficou a pergunta: O uso de drogas, álcool e outros temperamentos de abuso são mais aceitos quando a pessoa é alternativa?

Acho engraçado como certos comportamento são associados a alternativos. Mulheres tatuadas são promíscuas, homens de kilt e coturno são machistas, góticos são satanistas e por aí vai. Eu acho graça porque, na cabeça de muitas destas pessoas, alternativos não formam família, só trabalham na noite bebendo até cair com os clientes, ou fazendo parte de rituais satânicos para ganhar dinheiro. 

Gostaria de levar estas pessoas a conhecer algumas pessoas que conheci na vida. Tive uma amiga de faculdade que me revelou ser "da noite" (palavras dela), e eu confesso que nem imaginaria, e ninguém suspeitava. Uma outra tempos depois me disse que ganhava uns trocados na vizinhanças fazendo umas "simpatias daquelas bem malignas" em troca de dinheiro. E de novo, eu confesso que fiquei desconcertada. Ela nunca tinha falado disso e seu visual, seus hábitos, tudo nela definitivamente não transparecia. 

Eu me considero ser uma pessoa de extrema sorte por ter conhecido tanta gente diferente na vida, e ter ampliado meus horizontes desta maneira. Creio que aqueles que nos olham, com nossas caveiras, nossas cruzes, nossos olhos pintados, com nossas tatuagens, pensam muitas vezes que somos viciados em alguma coisa. Tem alternativos viciados? Tem. Tem não alternativo viciado? Tem. Tem pai de família viciado. Tem mulher de negócios viciada. E tem headbanger viciado. Tem lolita viciada. Tem otaku viciado. 

Nos anos 70 e 80, as drogas eram muito difíceis de sair de certos redutos. Quem procurava cenas alternativas, encontrava atreladas a elas drogas sendo liberadas. A necessidade de se libertar da sociedade normal, careta, levava a uma fuga onde o ápice do esquecimento muitas vezes era no fundo do copo ou no fim da carreira branca de pó. 

Músicos eram os ídolos, e os músicos se drogavam. Os anos 70 assistiram Janis, Hendrix, Morrison morrerem. Woodstock foi uma festa regada a ácido. Os Beatles, tão "fofinhos" cantavam os efeitos do ácido.  

Mas as coisas foram mudando. Vícios passaram a ser passaporte para ser descolado. Quem já andou nesta situação sabe o que estou falando. Parece que você não faz parte do grupo, simplesmente por não beber ou fumar, ou cheirar ou se chapar. 

E a medida que a sociedade ia lentamente abrindo seus olhos, vieram os outros vícios: sexo, compras, auto mutilação, internet, jogos. Estes mais sutis, mas perigosos também. Vi uma notícia de um rapaz que morreu depois de jogar Diablo 3 por 40 horas seguidas. Este é o tempo médio de trabalho semanal brasileiro. O que leva uma pessoa a isso? Prazer.

E é este prazer e aquela identificação com o grupo que citei que faz muita gente se viciar em diversos tipos de coisas. 


Eu sei que preciso me vigiar sempre, porque aquela necessidade de chocolate (que muitos achariam um exagero) poderia virar outra. E virou mesmo: durante uma boa época da vida, eu transferi aquele prazer para compras. 

Comprava pela internet que nem louca. Normalmente coisas miúdas - uma pulseira de 10 reais p.e. Mas era o tempo todo! Ficava caçando promoções na China, comprando coisas que nem eram exatamente o que precisava e queria, apenas porque estava barato. 

Estes tipos de comportamento são os mais letais porque são muito aceitáveis. Afinal, se você tem dinheiro para bancar suas compras (e eu tinha) podia ficar horas vendo roupas e outros sem me preocupar com a opinião alheia. Quem poderia dizer alguma coisa?

O que mais me entristece é que está cheio de pessoas percebendo que outra está viciado em algum comportamento mas não sabem dizer até onde aquilo faz mal. 

Eu tinha uma conhecida que era maluca por tirar fotos. Até aí, tudo bem. Mas ela tirava fotos de tudo o tempo todo! Eu não a via participar das conversas, até alguém mandar ela sossegar. Ela nunca aparecia nas fotos também. E claro, era a rainha do selfie. Mas quem pensou em avisá-la que aquilo estava fazendo mal? Ninguém. Nem eu pensei, admito. Ela se defendia dizendo que fazia parte do que esperavam dela.

Quando vejo alternativos usando sua opção por serem alternativos usando isso como escudo, como desculpa para se viciar em qualquer coisa, eu fico maluca. Isso aumenta o estigma, e você dizer "ei irmão assuma que faz isso porque quer, não porque é metaleiro" vira uma guerra. Você vira coxinha, vira careta, vira a mãe do sujeito.

Ele te evita como se você fosse algo nojento.

O caminho de qualquer vício é tão sinuoso e tão complexo quanto um labirinto dentro do mar. Se alguém tenta alertar levando a superfície, cabe a quem decidir nadar de volta assumir. E receber ajuda se precisar. Eu sou gótica, e não há uma lei que diga "góticos tem que beber vinho até ficarem loucos". Mas aquele que for beber, não vou jogar pedra. Mas que não me diga "faço isso porque sou deste grupo", "faço isso porque a sociedade me obriga", faço isso porque é o que esperam que eu faça". Se for uma exigência daquela subcultura, pense bem se você realmente está no lugar certo.  

Nenhuma subcultura alternativa pode exigir que você faça algo que vai te ferir, te chatear, ou te prejudicar sem seu consentimento. Seja se endividar em compras pra manter o estilo lolita; seja tomar ácido para curtir o show de metal; seja fazer sexo com pessoas que você não está afim só porque são góticos; seja cair de tanto beber por ser punk; seja fumar erva porque é grunge; seja pintar o cabelo fantasia para ser otaku. Porque é isso, a imposição de alguns dentro destas subculturas, que nos fazem todo dia lutar para mostrar aos pais, a amigos, a sociedade, que não é porque somos de outra mentalidade que sempre vamos fazer algo que não queremos.

Seja qualquer coisa que for dita, somos antes de tudo pessoas que pensam. Pessoas que tem uma cabeça e que devem sempre usá-la junto de sua vontade. 

E minha vontade não é imposta por ninguém.

Carpe diem, carpe noctem, finis est initium.

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